Pai de vereador ficou trancado por cerca de duas horas em agência na Avenida Piracicaba
Na reunião desta quinta-feira, 9 de maio, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara ouviu representantes do Banco do Brasil sobre denúncia de possível crime de racismo institucional. O caso foi relatado pelo vereador Ju Negão (MDB) e se refere ao pai do parlamentar, que ficou preso em uma agência do Banco do Brasil por quase duas horas, até que a Polícia Militar (PM) chegou ao local e a porta foi liberada.
Participaram do diálogo a presidente da Comissão, vereadora Isabelly Carvalho (PT), juntamente com os demais membros do colegiado, vereadores Ceará (Republicanos), vice-presidente, e Sidney Pascotto, Lemão da Jeová Rafá (PRTB), secretário; além de Ju Negão e os representantes da Agência 3136 do Banco do Brasil, localizada na Avenida Piracicaba, Rodrigo Sergio Mesquita, gerente geral; e Roberto Cassiano Homem, gerente.
Durante a reunião, os gerentes reforçaram as informações fornecidas pelo Banco do Brasil à Câmara em resposta à Moção de Protesto Nº 74, de autoria do vereador Ju Negão. No documento, a instituição bancária respondeu por ofício que após tomar ciência dos fatos, analisou as imagens do Circuito Interno de Vídeo onde foi constatado que José Eduardo Monteiro, “após a realização de suas operações financeiras, acionou o botão de liberação da porta de saída. Contudo, estando com a mão esquerda ocupada, não fez a abertura manual da porta”, justificou.
O Banco explicou que após a realização das operações, o cliente teria tido dificuldades para sair da sala de autoatendimento, situação que somente teria sido regularizada por volta das 21h36 após a intervenção da Polícia Militar. “Lembramos que o botão de liberação da porta apenas destranca a porta. No entanto, para que ela se abra, faz-se necessária a abertura manual da porta. Neste sentido, após a chegada da Polícia Militar ao local dos fatos, o cliente acionou o botão de abertura da porta e, imediatamente, a porta foi aberta após leve empurrar da porta pelo policial de plantão”, relatou.
Questionamentos
Segundo o gerente geral, foi observado pelas filmagens que o botão era acionado por José Monteiro e em outro momento era puxada a porta, o que teria impedido a abertura. O vereador Sidney Pascotto comentou que o cliente que ficou trancado na agência é uma pessoa esclarecida, utiliza frequentemente os serviços de autoatendimento do Banco e trabalha na Polícia Científica há 34 anos.
Rodrigo Mesquita enfatizou que o acionamento das portas é feito por meio de timer, um dispositivo temporizador que trava e destrava a porta no local. “Não há como fazer o acionamento da porta à distância, remotamente”, destacou o gerente, ao explicar que também não reside em Limeira, não estava na cidade no momento da ocorrência, e que tentou entrar em contato com outros funcionários até que alguém da equipe local pudesse se deslocar para auxiliar José Monteiro.
“Naquela noite, a Central entrou em contato comigo. Por isso, temos um procedimento de segurança para que eu acione um segundo funcionário que esteja disponível para se deslocar até a agência para ver o que está ocorrendo”, afirmou.
O vereador Ju Negão repudiou e considerou lamentável o ocorrido e salientou que o pai ficou retido na agência por quase duas horas. “Foram três protocolos que ele registrou ligando para o Serviço de Atendimento ao Cliente e pedindo ajuda para sair”, disse. O parlamentar propôs à Comissão que sejam solicitadas as gravações dos atendimentos feitos nesses protocolos, bem como as imagens internas e externas em vídeo e a conferência dos horários de todos os procedimentos adotados pela central de atendimento ao cliente, pela central de segurança, pelos funcionários do banco acionados e pelo contato com a Polícia Militar.
Os representantes do Banco ratificaram que se houve falha, não foi por motivo de racismo. O gerente Roberto Cassiano considerou o episódio como pontual e que medidas foram sugeridas pela agência de Limeira ao Serviço de Atendimento do Banco do Brasil para que seja adotado um roteiro com orientações imediatas aos clientes sobre a abertura da porta.
Roberto Cassiano pontuou que não há relação entre a ocorrência e qualquer forma de discriminação. “O procedimento não foi o melhor adotado e já foi encaminhado pedido para ser aprimorado. Seria simples de resolver se na própria Central de Atendimento houvesse um script para atendente orientar o cliente a apertar o botão e abrir a porta de forma concomitante. Não foi o que aconteceu, infelizmente a resolução decorreu de um tempo muito extenso, mas em nenhum momento esse atendimento demorou em função de o senhor José ser negro; poderia ter acontecido com qualquer outra pessoa que estivesse ali”, argumentou.
Deliberações
A Comissão de Direitos Humanos deliberou enviar ofício ao Banco do Brasil para que sejam disponibilizadas ao colegiado as imagens internas e externas do sistema de monitoramento da agência, na data de 15 de abril, no período das 19h40 às 22h05 e a gravação do sistema de atendimento – SAC, dos protocolos realizados pelo cliente retido.
A presidente Isabelly Carvalho ponderou que no caso de José Eduardo são apurados indícios de possível crime de racismo institucional. “Esse é um racismo que ocorre como uma discriminação direta ou indireta dentro de instituições públicas e privadas e que têm como causa o racismo estrutural, quando é praticado mesmo sem se dar conta”, comentou.
Com relação aos trabalhos do colegiado, esclareceu que todos os dados devem ser observados para que seja identificado o que de fato aconteceu. “É inadmissível, não é aceitável que qualquer pessoa fique retida por tanto tempo, seja por qualquer motivo. Então, precisamos entender ao máximo o cerne do que aconteceu para poder identificar qual a problemática e até elaborar propostas, na forma da lei, para que isso não volte a ocorrer”, defendeu.
Entenda a denúncia
O vereador contou aos membros da Comissão que o pai, José Eduardo Monteiro, realizou a denúncia formalmente via Gabinete Parlamentar. O caso foi registrado no dia 15 de abril. Segundo o relato, José Eduardo estava no plantão da Polícia Científica (IC Limeira), onde trabalha, e foi à agência do Banco do Brasil na Avenida Piracicaba por volta das 19h40 para efetuar o pagamento de três boletos, finalizando os pagamentos às 19h56, e em seguida se dirigiu à saída, no entanto, a porta estava travada. Ju Negão frisou que o horário de funcionamento da agência é até as 20h e que, inclusive, havia pessoas do lado de fora tentando entrar para utilizar os serviços do banco.
O parlamentar informou que o pai entrou em contato com o telefone que é disponibilizado para que os clientes reportem problemas nos caixas eletrônicos por três vezes, sendo que em todas elas os atendentes só orientavam José Eduardo a aguardar.
O denunciante aguardou a liberação por mais de 1h30, quando realizou a terceira ligação para a Central e o atendente informou que seria necessário chamar a polícia, mas que o monitoramento estava informado e que alguém ia aparecer para fazer a liberação. “Demorou acho que uns dez minutos, já era quase 21h40, uma viatura da PM parou em frente à agência, desceu o policial e fui tentar gesticular, tentar explicar que eu estava preso na agência, aí, de tanto que eu apertei, liberou a porta. Nessa hora caiu a ficha, nessa hora fiquei chateado, eu estava ali há mais de 1h30, entrando em contato, solicitando [a abertura da porta para o atendimento], e só me liberaram na hora que chegou a polícia”, narrou.
Na denúncia, José Eduardo destacou que internamente na agência existem placas informativas dizendo que após o encerramento do expediente há um botão interno que, ao ser acionado, a porta é liberada. “Se tivessem liberado a porta depois de conversar com o atendente […], mas depois que a PM chegou, não tem como você não se sentir, de certa forma, humilhado. Eu, sinceramente, nunca pensei em passar por isto na minha vida. Sessenta e sete anos, jamais imaginei uma situação desta”, enfatizou.